Meu encontro com Madre Teresa
Publicado; 04/12/2013 Arquivado em: Índia 19 ComentáriosNão tenho religião – ou como descobri nos últimos tempos, tenho todas elas. Então foi como turista, e não como devota, que quis visitar a casa de Madre Teresa, figura tão intrinsecamente ligada a Calcutá que a cidade virou seu sobrenome.
A história conta que o extremo leste da Índia foi um dos lugares mais abalados com os desdobramentos da independência indiana na década de 1940. Desarranjos políticos, religiosos e econômicos trouxeram à Calcutá milhares de miseráveis, esqueletos sem nome que morriam amontoados nas ruas (as fotos da época são o horror da vergonha a que chegamos como raça humana). Foi nesse contexto que a então enclausurada Irmã Teresa sentiu o chamado divino para sair às ruas e levar amor a quem já não temia sequer a morte, pois o inferno era ali mesmo.
A história também conta que ela não era uma figura unânime, mas confesso que fiquei com preguiça de procurar os defeitos da mulher que desembarcou sozinha em um dos cenários mais dantescos do mundo buscando fazer alguma diferença. Que morava em um quartinho minúsculo e abafado em cima da cozinha e nunca pediu sequer um ventilador. Que abriu centenas de casas aos desamparados e trabalhou até os 87 anos, já muito doente, sem esperar fortunas, promoções e férias em resorts no final do ano.
Mas foi sem saber de tudo isso que cheguei à casa. Também não sabia que ainda faltava meia hora para o horário de visitação, e já me preparava para esperar quando uma mulher se aproximou amparando um senhor de muletas, com uma prótese tosca no lugar da perna. Ela sorriu e me chamou para entrar com ela. Foi me levando pelo braço por dentro do convento até uma salinha meio escura, as luzes ainda apagadas. Por algum motivo, fui contemplada com meia hora sozinha junto ao túmulo de Madre Teresa, um dos pontos mais visitados da cidade.
Assim que cheguei aos pés da caixa branca de pedra, uma grande emoção me colocou de joelhos e as lágrimas brotaram sem parar. Justamente eu, que até ali sabia pouco além do nome turbinado pelo Nobel da Paz de 1979. Fui invadida pelas visões e sentimentos que resultaram em uma vida dedicada aos indesejados, e a experiência foi tão comovente quanto aterradora. Afinal, a responsabilidade pelo que está acontecendo é de todos nós.
“Eu vi uma multidão muito grande com todos os tipos de pessoas, muito pobres, e havia crianças também. Todos eles tinham as mãos levantadas para mim, que estava de pé no meio deles”, diz a Madre, sobre um de seus chamados, no quadro pendurado na parede. É a cena que vejo na Índia todos os dias, e a lembrança das imagens traz uma nova descarga emocional.
Antes de sair da sala, deixei uma oração na caixinha ao lado do túmulo. Pedi ajuda para que aquele meu sofrimento individual, meio inútil no contexto das coisas terrenas, seja transformado em ações concretas nos momentos certos. E que a perturbação pelo sofrimento do próximo nunca esmoreça. Acho que pedi para a pessoa certa.