Annapurna Parte 3 – A travessia

Não sou a mesma depois dessa temporada nas montanhas. E embora cada etapa da jornada tenha contribuído com seu quinhão, acredito que o chacoalhão que reverbera até hoje responde pelo nome de Thorung La.

Das poucas fotos que tenho (pegar a máquina na mochila dava exaustão pulmonar e o telefone congelou)

Desde o início do circuito, a necessidade de atravessar os 5,4 mil metros se impõe como uma obsessão dourada. A falta de distração nas pequenas vilas e a dedicação integral ao universo do trekking torna cada movimento uma ode ao Dia D. Tudo é pensado para evitar falhas, e a simples alusão à desistência é um tormento capaz de roubar horas de sono.

A altitude é a principal preocupação. À partir de 3,5 mil metros, o corpo começa a entrar em pane pela falta de oxigênio, e não são poucos os casos de resgate porque o negócio fica feio (ouvir o barulho do helicóptero chegando quando você está no primeiro quarto do circuito faz engolir seco). Mesmo aos mais resistentes, a qualidade de vida despenca após dias de sono interrompido de hora em hora pela falta de ar.

Também tem os reveses bizarros como o rapaz que caiu do cavalo e quebrou a perna, o homem que teve os dedos do pé congelados e o casal de férias que precisou voltar com o guia que estava passando mal. As más notícias vão se espalhando como lastro de pólvora para quem vem atrás e dão a devida proporção da seriedade da coisa.

No meu caso, o fator clima foi o mais complicado. Os livros garantem que meados fevereiro, finzinho de inverno, é um bom momento para o trekking porque o Annapurna ainda não está abarrotado de turistas, mas tampouco tão gelado. Só esqueceram de avisar a neve, que caiu em quantidade suficiente para paralisar dois dias e meio de caminhada e fazer da travessia um momento de inflexão para a vida toda.

A primeira tentativa de vencer o Thorung La falhou. Liderados pelo guia emprestado de um casal mexicano, cerca de 10 pessoas saímos embaixo de neve às 6 da manhã. Mesmo relutando para não deixar o grupo (pois sabia que não atravessaria sozinha), fui a primeira a desistir e voltar para o High Camp. O vento jogava gelo para dentro dos olhos, e o caminho que já estava suficientemente perigoso e escorregadio se tornou impraticável. As pernas bambearam, senti falta de ar. Depois de meia hora, ouvi vozes do lado de fora do quarto – todos voltaram.

Felizes pouco antes do fracasso do primeiro dia

Passamos o resto do dia frustrados, a neve sem dar trégua do lado de fora e o frio matando do lado de dentro. Várias pessoas decidiram voltar para Pokhara, e para os que ficaram, foi difícil manter o positivismo. Sabíamos que o psicológico refugaria se a manhã seguinte estivesse daquele jeito.

Mas o dia amanheceu glorioso. O sol forte desimpedido de nuvens deixou a neve recente ainda mais brilhante, ofuscando os olhos e queimando a pele. Meu pulmão sentiu cada um dos 566 metros da subida final, e pedia cargas extras de oxigênio em paradas esbaforidas a cada cinco minutos. A visão panorâmica das pessoas se arrastando, dando o seu melhor, animando umas às outras, era emocionante. No topo após cinco horas, mal consegui posar para as fotos porque cada movimento significava exaustão pulmonar.

Puxando um sorriso do fundo da alma no ponto mais alto

Mas o apocalipse veio mesmo depois. Já apostava na descida como um dos momentos mais difíceis do trajeto, pois implicava em despencar 1600 metros de uma vez. Só que a enorme quantidade de neve acumulada elevou o desafio a níveis hercúleos. Mesmo com o apoio de bastões de caminhada, devo ter caído umas 20 vezes, e cada reerguida do meio do montão de gelo fofo demandava uma energia que não sei de onde veio.

O trajeto levou mais tempo que devia, e com o sol já querendo alaranjar, nos vimos no meio de um mar branco sem água nem comida. Apelei para a neve quando a sede apertou. O mais perturbador era pensar que nem desistir era permitido, pois o telefone continuava sem sinal e helicópteros não chegavam ali.

Depois de quase 12 horas atropelando os próprios limites, ver  Mukhtinath surgindo iluminada pelos últimos raios da tarde foi como chegar a um reino encantado de boa novas e abundância, com a sensação sublime de dever cumprido.

Mukithnath surge encantada ao entardecer

*****

Aos aventureiros curiosos para saber o que aprontei por ali, segue um perfil técnico sobre a temporada no Annapurna:

Dia 1 – Pokhara – Besisakar: ônibus. Besisahar (820m) / Ngadi (890m) – Subida 70m, Distância 13km

Dia 2 – Ngadi (890m) / Jagat (1300m) – Subida 410m, Distância 12km

Dia 3 – Jagat (1300m) / Dharapani (1900m) – Subida 600m, Distância 15km

Dia 4 – Dharapani ( 1900m)/  Timang (2516m) – Subida 616m, Distância 8km (Dia interrompido com neve a partir das 12h)

Dia 5 – Timang (Dia parado: neve)

Dia 6 – Timang (2516m)/ Dhukur Pokhari (3240m) – Subida 724m, Distância 21 km

Dia 7 – Dhukur Pokhari (3240m)/ Ngawal (3680m) – Subida 440m, Distância 11 km

Dia 8 – Ngawal (3680m) / Manang (3540m) – Descida 140m, Distância 10 km

Dia 9 – Manang (3540m)/ Ledar (4200m) – Subida 660m, Distância 10 km

Dia 10 – Ledar (4200m) / High Camp (4850m) – Subida 650m, Distância 7km

Dia 11 – High Camp (Dia parado: neve)

Dia 12 – ((DIA D)) High Camp (4850m) / Thorung La (5416m)/ Muktinath (3800m). Subida 566m, Descida 1616m. Distância 14 km

Dia 13 – Mukthinath (3800m)/ Kagbeni (2800m). Descida 1000m, Distância 10km

Dia 14 – Kagbeni (2800m) / Kokhethanti (2525m). Descida: 275m, Distância 29 km

Dia 15 26 – Kokhethanti (2525m) / Tatopani (1200m). Descida: 1325m. Distância 23 km

Dia 16 – Tatopani (Dia de folga: Festival Shivaratri)

Dia 17 – Tatopani – Beni – Pokhara: ônibus

Total percorrido a pé: 183 km. Altitude escalada a pé: 4596m.


Annapurna Parte 2 – “Sozinha” (eterna)

A despeito da eremita que habita em mim, jamais cogitei desbravar o Annapurna sozinha. Me tranquilizava o discurso dos demais mochileiros sobre a facilidade para conhecer gente ainda no aeroporto de Kathmandu.  Mas os dias foram passando e nada. Só aí percebi que nenhum deles tinha passado pela baixa temporada para contar história.

Na madrugada daquele 11 de fevereiro, estava muito mais preocupada que feliz. Tinha passado os últimos três dias em Pokhara vagando de café em café, estudando o livro mágico e os mapas, esperando aparecer, quem sabe, uma companhia de última hora. Mas a cidade constantemente invadida por enxames de mochileiros estava às moscas.

Depois de horas rondando pelo quarto, estanquei a autovitimização ao entoar o mantra que vem me acompanhando desde o começo da viagem: não criar expectativas com situações que extrapolam meu próprio poder de ação e de decisão. Transplantado para a vida real, esse conceito implica em seguir confiante, e ao primeiro sinal de dificuldade insuperável, retroceder com a certeza de que fiz o que pude. No dia seguinte, peguei o ônibus já com a serenidade monástica que deu o tom do resto da jornada.

Dos 13 dias efetivos de caminhada, estive sozinha em apenas quatro e meio – três deles por opção, quando matutava sobre a vida já na descida. A maior parte da trilha é cansativa, porém não perigosa, com espaço suficiente para passar cavalos e bicicletas (isso quando ela não coincide com as estradas locais). O único requisito é caminhar – nada de pulos, agachamentos ou escaladas com a mão, que acionariam o botão eject sem dúvida.

Hoje analiso que o trekking solitário é altamente possível, embora não 100% recomendável. Sempre existe a chance de torção/queda, o que pode complicar porque sinal de telefone inexiste ali para pedir socorro. Contando só com o livro, também havia a possibilidade de me perder, mas o risco foi neutralizado com o empurrãozinho da gente local. Nos momentos de maior dúvida ou dificuldade eles apareciam do nada para apontar o caminho certo, jogar pedras nos cachorros prestes a avançar em mim ou falar quanto tempo faltava para a próxima vila.

Mesmo ciente dos perigos da aventura solo (cogitei até ataques assassinos de raposas e de leopardos da neve, vejam bem), foi justamente essa condição que permitiu alguns dos momentos mais marcantes dessa temporada. Porque a natureza nesse setor pontiagudo do planeta é tão esplendorosa que chega a dar nó na garganta, e não foram poucas as vezes em que me peguei falando em voz alta com as montanhas, elogiando tamanha formosura. Também não foram poucas as vezes que me perguntei que diabos eu,  essa m******* insolente, estava fazendo plantada sozinha no meio dos Himalaias.

Mas não tive medo. Depois de dias explorando seus meandros, mergulhada em silêncio contemplativo, senti que era bem-vinda ali.

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p.s.: Tom, Sam, Andrew, Johannes, Max e Dog, obrigada pela ótima companhia e pelo apoio nas longas horas de caminhada. E agradecimentos mais que especiais aos meus kiwis super queridos Asher e Ben, os caras que estavam lá quando mais precisei.

p.s.: Tom, Sam, Andrew, Johannes, Max and dog, thanks to the great time and support during the long walking hours. And very special thanks to my super dear kiwis Asher and Ben, the guys that were there when I needed most.


Annapurna Parte 1 – Mirabolante

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Minha favorita, vista de Pokhara.

Ao longo dos últimos meses na estrada, o Nepal invadiu meu imaginário como a maior experiência de vida que estaria por vir. A idealização foi sendo alimentada por mochileiros que apareceram pelo caminho, em relatos carregados de montanhas, rios e vilarejos. Exploraram, esperaram, insistiram, para depois dizer com a satisfação de quem se permitiu o solavanco: “sim, eu estive lá”.

Já em Kathmandu, meu primeiro desafio foi escolher que rumo tomar. Estrela absoluta, o Everest fica no nordeste do Nepal e tem um circuito super popular de ida e volta ao seu acampamento de base (é de lá que os montanhistas sérios partem para a escalada rumo ao topo). Segundo fotos e depoimentos, o cenário dramático consiste de montanhas, rochas e gelo.

A região do Annapurna, no centro norte, também tem seu roteiro de ida e volta para acampamentos de base, sendo que um deles vai para a minha montanha favorita, Machapuchare (talvez o amor venha da semelhança com a montanhazinha da Paramount, pode googlar).  Mas o trekking que me ganhou desde o início foi o Annapurna Circuit, mais longo, que abraça 200 quilômetros da região.  O combo inclui inúmeras vilinhas, cenário mutante de verdes vales a picos nevados e o desafio de subir a 5,4 mil metros com a possibilidade de fazer a volta por um caminho diferente.

Mas ainda tinha um bônus de fase. Na Índia, soube de um esquema que permitia cumprir o AC independentemente, sem precisar contratar guia. Um belga apaixonado pelo Nepal deixou marcas pelo circuito indicando o caminho, e descreveu todo o trajeto em um livro que está disponível gratuitamente para download (mas que relativamente pouca gente conhece, segundo minha própria experiência). Sabe uma irresistível caça ao tesouro da vida real procurando sinais entre florestas e montanhas? Isso.

Mas ainda tinha o fato de estar sozinha, situação que ninguém tinha me descrito até então.

Isso deixo para o próximo post.


Não vou ao Butão (13 razões)

Por enquanto, só esse.

Por enquanto, só esse.

Decidi só ontem, mas esse conflito desistencial vem me atormentando desde a volta do trekking pela região do Annapurna. Visto nepalês expirando, precisava correr com a burocracia butanesa (1), só que não conseguia sair do lugar. Os porquês foram aparecendo quando o automartírio se rendeu à racionalização dos motivos mais que óbvios.

Para entrar no Butão, só com agência de viagem (2) – manobra que, no meu brado eterno por independência, nunca precisei usar até aqui. Aí vem a dificuldade de tentar achar uma empresa (autorizada pelo governo de lá 3) que combine com você (4), afinal de contas, seu Butão vai ser o que eles decidirem mostrar. E você vai estar sozinha com seu guia e motorista 24 horas por dia (5), sem liberdade de ir e vir (6) e sem ninguém para pelo menos rir da situação caso o pato queime no forno (7).

Considerando que esquema ruim é o que não tem faltado nessa viagem, “por que não arriscar” seria a solução mais justa com o país mais feliz do mundo. Mas errar pagando 20 reais na Índia, ok. Queimando 250 dólares por dia no Butão, a coisa muda (8). Não desisto. Disparo vários e-mails para tentar me animar com os prós facilitadores que só uma agência pode oferecer, mas quê respostas (9)?

Dado o preço padrão Maldivas, sabia há muito que a programação no Butão teria que ser rápida, três a quatro dias no máximo (10). Pesquisando o que isso significa na vida real, percebi que desceria no aeroporto no primeiro dia, passaria voando pelas duas principais cidades, e voltaria para o aeroporto no quarto dia. Toda uma logística e gastos para dois dias completos nas áreas mais urbanizadas do país que é considerado o último Shangri-lá do planeta Terra. Hmm (11).

Aí que estava justamente procurando quantos dias seriam necessários para esse Butão fast food quando o Google denuncia entre os primeiros resultados: 5 reasons why Bhutan is *NOT* worth the $200 per day tourist fee. Resumindo, o cara afirma que o Butão é um Nepal restritivo com preços inflacionados e paisagens não tão legais (12). Ei péra, eu estive no Nepal no ultimo mês vivenciando a liberdade absoluta em cenários fantásticos, às vezes sem nem precisar pagar pela acomodação. A partir daí, meu cérebro não permitiu que essa questão ilógica fosse adiante.

Por último, mas não menos importante, Annapurna acabou com a minha sanha por montanhas, trekkings e vilarejos no momento (13).

Amanhã: Bangkok, Tailândia.

***

p.s.: sinto que essa despedida pode não ser definitiva. Quando a vontade de montanha voltar tento retomar o flerte – resta saber se ele ainda vai me querer.

 


Um alô dos Himalaias!

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Eu não sei nem por onde começar a descrever tudo o que aconteceu desde o dia 12 de fevereiro, quando comecei o trekking de 16 dias pelo circuito do Annapurna.

Como essa é a primeira comunicação com o mundo desde o dia 1, e a conexão não é aquela beleza, vou resumir: tem sido uma das experiências mais sensacionais dessa viagem. E digo isso não apenas pelas paisagens incríveis entre as montanhas absolutamente empinadas dos Himalaias, mas principalmente pela enorme quantidade de pequenas vilas pelo caminho e a possibilidade de submergir em uma realidade tão tão distante da nossa, em um mundo onde internet e telefone não fazem a mínima diferença.

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Mas depois explico isso melhor.
Hoje está um lindo dia ensolarado de céu azulíssimo e preciso aproveitar para continuar viagem depois de ficar dois dias presa em uma vila esperando uma nevasca daquelas passar.

Aos afoitos de plantão, bom saber que aqui quem manda é a natureza.

ps: aos amigos preocupados com segurança, fiquem tranquilos que não estou no time dos afoitos e as trilhas não são perigosas. Ah, e nunca estou sozinha, sempre tem gente pelo caminho!

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Brasiuiuiuiu

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Índia, Sri Lanka, Maldivas, Nepal… Todo mundo só quer saber do nosso futebol.

Quando o pessoal da Ásia pergunta de onde sou, um grande sorriso é o invariável efeito da resposta Brasil (isso quando não entendem Belgium e fazem cara de “tá”).

Eles não sorriem porque somos uma potência sul-americana (“Fica na África?”).

Eles não sorriem porque nossa economia está em trote e a classe média enlarguece a perder de vista.

Eles não sorriem porque conhecem Michel Teló, Tropa de Elite, Dilma.

Eles não sorriem porque aparecemos muito por aqui para gastar nossos reais.

As palavras eufóricas que seguem a revelação são: FOOTBALL! RONALDÔ! KAKA! PELÉ! Sempre, sempre sempre.

(Um garçom do resort das Maldivas, que é do Bangladesh, quase desconjuntou minha mão de tanto sacudir quando descobriu que sou brasileira. Confidenciou que o garoto dele chora de emoção toda vez que nossa seleção entra em campo).

Se já era entusiasta do esporte, fico cada dia mais abismada com o poder doutrinador de uma simples bola no pé (no nosso pé, que fique bem claro).  Aqui a expressão “país do futebol” não é clichê-marketing.

20140212-153028.jpgA viagem só acaba em novembro, mas no dia 12 de junho, tenho passagem para casa. Aqui e no Bangladesh, não conteremos a emoção diante da TV.

#vaibrasil

p.s.: justiça seja feita, a Argentina é tão ou mais lembrada por esse mesmo motivo. Messi é quase uma religião, Neymar sequer é citado.

p.s.: com esse post nacionalzão, lembro a chegada do quarto mês longe de casa. Mas a casa vai comigo, ah vai.

 


Amnésia

Hoje acordei meio sei lá. Ninguém para conversar. Ninguém para falar bom dia (em português) depois de quatro meses.

Estou em Pokhara, o Nepal turistão (mas os turistas ainda não chegaram direito, só em março). Festa esvaziada, todo mundo ansioso para chegar logo. Mas eu, que estou aqui agora, fico ansiosa sem saber porquê.

Saio para caminhar, vozes femininas chamam de uma ruela afastada. O cenário atrás da cortina improvisada é ainda melhor que a promessa: mulheres entre a meia-idade e nenhum dente na boca estão em algum tipo de evento só para elas. Cantando e rindo, as senhoras sentadas no chão tocam tambores e sinos e entoam músicas que parecem sempre as mesmas, mas considerando as reações diferentes da plateia, não são. As roupas parecem de festa, estilo sari indiano, mas com toque local com as trouxas amarradas na cabeça. No meio da roda tem sempre alguém dançando e não pude negar quando me convidaram. Ninguém falava inglês e nem entendi direito onde estava. Passei um bom tempo ali, batendo palmas e sorrindo, sem coragem de fotografar um evento tão intimo e estragar nossa relação recém-nascida.

Segui meu caminho rumo ao topo, e na descida do templo, todas as crianças que saiam da escola me faziam sorrir com um “rariú” (e nem eram de Recife, I do love cafusu <3). Mais um pouco, quatro pequenos em um terreno baldio insistiram, irresistivelmente, para que eu me juntasse a eles no jogo de peteca/tênis que eu nunca lembro o nome e que eu nunca tinha tentado antes de hoje.

Já esqueci o começo deste post.


Para que ano fomos, Doc Brown?

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A tal mini-praça, o tal templo, a tal mulher de xale.

O Nepal vai bem, mas não esse que você está pensando.

Em algum momento criamos a imagem de um país tranquilíssimo nas montanhas encrustadas de monastérios budistas. Pois 80% da população é hindu, e considerando a capital, tranquilidade é um conceito que não se aplica (ainda que o ritmo esteja longe de uma metrópole convencional).

Se Delhi era o choque desconcertante entre pobreza e luxo, Kathmandu é a convulsão temporal encarnada. Me esforcei para lembrar que estou em 2014 enquanto caminhava pelas empoeiradas ruelas que desembocam em mini-praças medievais. Nos pés dos templos, mulheres enroladas em xales passam o dia acocoradas junto às mercadorias expostas em lonas e sacos, os legumes e verduras pesados na balança de mão. Nos açougues, as carnes são exibidas em balcões que dão para a rua, o cheiro de sangue invadindo a calçada.

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Em harmonia com a arquitetura dos templos, as rústicas habitações de três a cinco andares nas sobrelojas são ornamentadas com janelas esculpidas em madeira. Perambular pelos pátios internos formados pelos prédios é ser transportado para uma outra época, onde a água do poço é bombeada manualmente e as crianças brincam na rua.

A noite chega e quase não há iluminação pública. O breu completo é quebrado por feixes esquálidos de luz que vazam das lojas equipadas com minigeradores ou um gato bem puxado. Muitos estabelecimentos só contam com luz de velas.

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Reasseguro estar no Século 21 enquanto caminho pelos bairros mais novos salpicados de shoppings e de estabelecimentos ocidentalizados. Na área dos mochileiros, rapazes de franja lambida da moda vendem jaquetas North Face para turistas despreparados. Guardas passam o dia empenhados em domar o trânsito nas ruas por onde passam carros e ônibus, e os rios tentam arrumar um espacinho para fluir entre a enorme quantidade de lixo.

Kathmandu parece um pássaro que precisa sair do ovo que já não comporta a vida lá de fora. Mas aí o pássaro não sabe viver de outro jeito (ou prefere esse mesmo) e vai ficando até quando der, a casca toda rachada deixando entrar o novo, para o bem ou para o mal.

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p.s.: sabe o Sri Lanka? Finalmente carreguei todos os álbuns aqui!


Quiz do domingão

Hoje teve mais um daqueles eternos debates sobre a situação socioeconômica dos países do mochilão. Depois de reiterar que o Brasil não está tão distante dessas realidades, veio o desafio: “Então veja lá o IDH”.

A fórmula de cálculo do Índice de Desenvolvimento Humano, usado pela Organização das Nações Unidas desde a década de 1990,  não é unânime entre estudiosos. Mas não deixa de ser uma régua para os 186 países analisados – e adoramos uma lista, vai.

Divido o quiz com vocês para embalar esse domingão preguiçoso de sol escaldante. Façam suas apostas (respostas depois do mapa).

Destinos, pela ordem: Índia, Sri Lanka, Maldivas, Nepal, Butão, Tailândia, Mianmar, Laos, Camboja, Vietnã, Malásia, Cingapura, Indonésia, Filipinas, China, Mongólia.

(Reprodução IDH 2012 UOL)

(Reprodução IDH 2012 UOL)

Posição dos países no ranking: 13º Hong Kong (China); 18º Cingapura; 64º Malásia; 85º Brasil; 92º Sri Lanka; 101º China; 103º Tailândia; 104º Maldivas; 108º Mongólia; 114º Filipinas; 121º Indonésia; 127º Vietnã; 136º Índia; 138º Laos e Camboja; 140º Butão; 149º Mianmar; 157º Nepal.