Ponderando

Desembarquei em Malé com vaga ideia do que seria uma ilha habitada. Uma semana depois, concluo que Maafushi é as Maldivas para todos, mas também  para poucos.

Os amantes da estética se desapontariam com a relativa economia de enquadramentos cênicos. Os exclusivos agonizariam no papel de meros figurantes da vida local, que corre as ruas de areia em motos sem capacete e relaxa preguiçosa em cadeiras de corda. Os insones se esbugalhariam ao acordar diariamente às 5h com os cânticos entoados nos autofalantes das mesquitas. Os ambientalistas sangrariam verde com a quantidade de lixo acumulada em algumas partes da ilha, sem aparente solução. Os medrosos tremilicariam ao dividir espaço com o único presídio local. Os fanfarrões pensariam duas vezes antes de pisar em uma ilha onde não é permitida venda de álcool.  Os exibidos se indignariam com a restrição do biquíni a apenas uma praia pequetita, cercada por um biombo.

Mas Maafushi também é a ilha de quem acha que luxo mesmo é poder visitar as Maldivas para ontem, sem mais delongas financeiras. É a ilha dos amantes da simplicidade, que não gostam da sensação meio incômoda do serviçal sempre à disposição. É a ilha dos admiradores da realidade bruta: a garrafinha de água que você ajudou a tomar está ali boiando e alguém precisa fazer alguma coisa. É a ilha de quem acha tão incrível dividir o mar com mulheres de burca que nem se lembra do fato de estar vestida. É a ilha de quem regozija ao pagar justo, e onde é possível jogar pelada com os habitantes e ganhar florzinha da dupla de meninas que estão sempre na frente do mesmo portão. É a ilha para quem não hesitaria em trocar o mergulho na piscina privativa do quarto superdeluxe pelo banho em uma nova cultura.

E você? Qual?

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p.s.: Com essa, termino a temporada no reino paradisíaco tropical e parto rumo a um mês no teto do mundo, vulgo Nepal. Diz que vai ter até trekking de 16 dias. A conferir.

p.s.1: se perdeu? Me segue no mapa!


O mar e eu

Ele

Ele

Desde pequena sonho, vez ou outra, que estou voando. Um impulso no chão e ganho o ar transparente, o corpo leve, enquanto a vida passa curiosa lá embaixo. Pernas e braços soltos, sou levada pelas correntes de ar até a manhã seguinte, na incômoda paralisia dos limites humanos.

Paralisia, no meu caso, também psicológica. Sou daquelas telúricas convictas, que entra em pânico só de pensar na possibilidade de despencar de um paraquedas ou de planar em um parapente. Já me acovardei diante de uma tirolesa. Então imaginem minha surpresa ao ver esse delírio onírico voador acontecendo sem aviso bem diante dos meus olhos.

Antes de tudo, esclareço que sempre fui refratária à ideia de mergulhar. A diferença é que, aqui nas Maldivas, não precisa de curso, ou do asfixiante tubo de oxigênio, ou de preocupar se dá pé – essas coisas que fazem refugar os amantes de terra firme. O mar turquesa sem ondas salpicado de corais e de peixes coloridos rodeia cada ilha, na profundidade de uma cintura. Estava fácil: emprestei a máscara/snorkel da pousada e, quando dei por mim, já tinha residido uma hora e meia no mundo subaquático nas cercanias de Maafushi. Tempo só lembrado pela dor nos dedos completamente enrugados.

Empolgada com a descoberta, arrisquei um coral em mar aberto no dia seguinte. Aos poucos, a adrenalina com o salto do barco foi dando espaço à serenidade hipnótica de ouvir apenas a própria respiração, enquanto a visão se abobalhava com o mar – cristalino perto do coral, deep blue logo ali na frente.

Depois de um bom tempo entretida com peixes dançarinos comedores de corais, pepinos do mar molengas e tudo mais que mora lá embaixo, prestei atenção em mim mesma. Os braços e pernas soltos flutuando na corrente transparente. Corpo leve, observando o mundo curioso lá embaixo. O déjà vu veio acompanhado de um enorme sorriso mental (porque se sorrisse de verdade entrava água pelo snorkel).

Eu estava voando no mar das Maldivas.

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p.s.: quando tinha 14 anos tive uma breve experiência com snorkel em Angra dos Reis. Experiência que colaborou para o meu refugo aquático desde então.


Maldivas para gente normal

O famoso guardanapo esboçado em Goa. Alguém aí lembrou do filme A Praia?

O famoso guardanapo esboçado em Goa. Alguém aí lembrou do filme A Praia?

Nunca pensei, concretamente, que um dia estaria nas Maldivas. No máximo, sonhei estar aqui quando tivesse cacife suficiente para achar que 10 mil dólares em uma diária seria bom negócio – vulgo nunca (mesmo com o dinheiro suficiente).

Só que tinha essa viagem, e estaria mais perto do arquipélago que jamais pensei na vida. Lembrei do tissunami de 2004 e do filme que meu amigo trabalhou, sobre um presidente lutando para que seu país não naufrague com os efeitos do aquecimento global. Lembrei que eu mesma posso cair dura amanhã. E aí já estava com a passagem em mãos.

Desde então, me desafiei a encontrar a falha no sistema, as Maldivas pagáveis. O plano começou a ganhar forma quando conheci, no balcão de um bar em Goa, um casal maldivense mochileiro. Entre um drinque e outro, eles detalharam em um guardanapo as ilhas onde era possível ficar por uma pechincha. Nunca ouviu falar disso? É que esses empreendimentos só ganharam corpo em 2010, quando o governo autorizou turismo nas ilhas habitadas pelos locais.

A conclusão é que dá para vir em um esquema totalmente independente, mas ciente de que você paga pelo que você tem. No lugar do speedboat de US$ 200, pegue o ferry público de US$ 1,5. No lugar da ilha isolada, fique na ilha habitada, onde é possível ter acesso ao famoso mar turquesa com uma imersão bem vinda na cultura local. No lugar do resort de US$ 1 mil, fique na pousada estalando de nova por US$ 40.

E se como eu, você sentiria uma dorzinha no coração por estar tão perto do luxo e não poder desfrutar, a parte boa é que até nisso dá-se um jeito. As ilhas habitadas oferecem daytrips para os resortões cinco estrelas por um preço até 10 vezes menor que seria investido em uma diária. Você vai em um idílico passeio de barco, almoça, faz massagem, desfruta da piscina, posta a riqueza no Face com cara de rico… e volta para o aconchego do lar no fim do dia, feliz por poupar US$ 900 na brincadeira.

Venham!


Quiz do domingão

Hoje teve mais um daqueles eternos debates sobre a situação socioeconômica dos países do mochilão. Depois de reiterar que o Brasil não está tão distante dessas realidades, veio o desafio: “Então veja lá o IDH”.

A fórmula de cálculo do Índice de Desenvolvimento Humano, usado pela Organização das Nações Unidas desde a década de 1990,  não é unânime entre estudiosos. Mas não deixa de ser uma régua para os 186 países analisados – e adoramos uma lista, vai.

Divido o quiz com vocês para embalar esse domingão preguiçoso de sol escaldante. Façam suas apostas (respostas depois do mapa).

Destinos, pela ordem: Índia, Sri Lanka, Maldivas, Nepal, Butão, Tailândia, Mianmar, Laos, Camboja, Vietnã, Malásia, Cingapura, Indonésia, Filipinas, China, Mongólia.

(Reprodução IDH 2012 UOL)

(Reprodução IDH 2012 UOL)

Posição dos países no ranking: 13º Hong Kong (China); 18º Cingapura; 64º Malásia; 85º Brasil; 92º Sri Lanka; 101º China; 103º Tailândia; 104º Maldivas; 108º Mongólia; 114º Filipinas; 121º Indonésia; 127º Vietnã; 136º Índia; 138º Laos e Camboja; 140º Butão; 149º Mianmar; 157º Nepal.


A tortura da logística

Um ano de viagem. Tempo de sobra para ver muita coisa, né? Hm, nem tanto.

Como vocês já devem ter percebido no roteiro, são 16 países em 12 meses, uma conta apertada de menos de um país por mês.  A situação dá uma aliviada porque a passagem vai ser mais rápida em alguns lugares. Butão e Maldivas, cujos custos são super altos, vão receber menos de uma semana. Cingapura, que é menorzinha, também deve demandar bem menos de um mês.

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Por outro lado, países de dimensões continentais, como Índia e China, são um desafio logístico a parte. Só para a Índia foram reservados três meses. Parecia mais que suficiente até começar a marcar no mapa as cidades/pontos de interesse.

Cheguei a um assombroso número de 64, uma média de 1,4 dia por cidade (!!!). Junte isso à tentativa de encaixar deslocamento geográfico com os períodos de festivais e ao quebra-cabeça para minimizar os riscos de segurança, e você chega a uma pessoa que já não tem unhas para roer há um bom tempo.

A conclusão é que alguma coisa vai ficar para trás, mas aí vem a tortura de pesar o que é mais importante quando tudo parece merecer uma visita, “já que vai estar lá mesmo”. E eis mais uma reflexão para o capítulo de que viagem e relaxamento nem sempre caminham juntos.


Vistos – Índia, Sri Lanka e Maldivas

Poupando horas de pesquisa dos leitores viajantes, parte 1.

Para chegar em Thanjavur, so com visto. (Ryan Ready / Creative Commons)

Para chegar em Thanjavur, em Tamil Nadu, só com visto. (Ryan Ready / Creative Commons)

Índia – Exige visto de brasileiros. O Consulado Geral em São Paulo atende São Paulo, Rio de Janeiro e os estados do Sul, enquanto a Embaixada da Índia em Brasília todos os demais estados. Ambos aceitam envio de documentação pelos Correios. Em Brasília é possível se apresentar pessoalmente e as taxas podem ser pagas em dinheiro (direto na Embaixada) ou em cheque administrativo. São Paulo só aceita depósito em conta e o atendimento personalizado é liberado apenas para emergências.

São diversos tipos, taxas e períodos de duração de visto, dependendo do perfil do visitante (turista, negócios, estudantes, trabalho, jornalista, voluntários, etc) e dos locais visitados (há várias áreas protegidas que exigem pedidos específicos). Em São Paulo, por exemplo, um visto básico para turista, com duração de seis meses e múltiplas entradas, sai por R$ 185 com todas as taxas inclusas, e geralmente é expedido em um dia (sem contar o período de trânsito pelos Correios). Detalhe importante: a validade do visto indiano começa a correr a partir da data de expedição, e não de entrada no país.

Sri Lanka –  Tem um sistema online de vistos para entradas de até 30 dias. A taxa geral é de 30 dólares, e pode ser paga com cartões de crédito das principais bandeiras. O prazo do visto começa a contar a partir da data de chegada ao país.

Até os paraísos tem uma certa burocracia.  (Maldivas/ Sarah Ackerman)

Até os paraísos têm regras. (Sarah Ackerman / Creative Commons)

Maldivas – O visto de 30 dias é emitido na chegada, gratuitamente, para todos os visitantes. É preciso apresentar passaporte, comprovante de passagem de volta e de fundos suficientes para permanência no país (150 dólares por dia ou confirmação de reserva em hotel ou resort).

*informações atualizadas até agosto de 2013