Laotizando

20140511-013943.jpg

Passa de meia noite. Escrevo esse post de um vilarejo incrustado entre escarpas calcárias gigantes no norte do Laos. Na casa bem ao lado, caixas de som ecoam desde manhã uma mistura de canto tradicional, sino, pandeiro e rabeca rústica. A rua, fechada com tendas, mesas e comida, reúne gente em frente a uma casinha de boneca com luzes e dinheiro pendurados. Vibram e batem palmas a cada final de repente berrado ao microfone. Tudo que consegui apurar é que se trata do evento fúnebre póstumo de um querido pai.

É esse país que vem me enredando nos últimos dias, entre encantos e desenganos. Exceto pelos olhos amendoados, o Laos, melhor dizendo, Lao PDR (People’s Democratic Republic, após a adoção do comunismo em 1975), em nada lembra os vizinhos visitados até aqui. O deslumbre acentuado da natureza e da diversidade étnica batem de frente com a indigesta história política recente de mortes e de miséria humana. Meu coração fica entre derretido e estilhaçado a cada nova investida na cultura local.

Não sei o que mais me pegou até agora.

Se o clima interiorzão do Brasil, de economia essencialmente rural (a maioria dos industrializados vem do Vietnã e da China).

Se o relance de sombra a cada “saibadee” (o oi daqui), resultado de um século de guerras e de tensões políticas que ainda se manifestam em assassinatos e explosões de bombas hibernantes.

Se o povo dócil e festeiro apesar de tudo, ainda não descaracterizado por invasões turísticas. Do tipo que adora um churrasquinho embalado a karaokê e convida para brindar o aniversário com uma BeerLao (servida com gelo).

Se a diversidade que junta maioria budista, culturas tribais, herança vietnamita e chinesa e toque colonial francês.

Se o clima de temperaturas mais amenas e chuvas diárias (que dirá depois da experiência forno-humano na Tailândia e em Mianmar).

Se a natureza padrão super deluxe plus, especialmente exuberante a bordo dos majestosos rios Mekong e Nam Ou.

Se a beleza mágica da antiga capital real Luang Prabang, patrimônio tombado pela Unesco.

Passa de duas da manhã. Cansado de tanta barulheira, o pai mandou um vendaval para acabar com a festa.